O leite está entre os alimentos mais consumidos no mundo, sendo produzidas 816 milhões de toneladas todos os anos. Como era de se esperar, o Brasil é o 4º maior produtor e, apesar dos avanços da tecnologia na produção leiteira, o setor ainda enfrenta muitos gargalos no que diz respeito à produtividade, qualidade do produto e rentabilidade dos produtores.
Segundo a Embrapa, os últimos anos foram difíceis para os pequenos e médios produtores que sofreram com a crise econômica, a queda do consumo interno e o aumento dos custos de produção. Contudo, as perspectivas são positivas e o mercado deve se estabilizar em 2019. Mas uma coisa é certa: o nível de eficiência da produção é o que determina o sucesso do negócio.
Ou seja, a rentabilidade deve melhorar para o produtor que planejar a compra dos insumos, investir em tecnologia e buscar elevar os índices zootécnicos do rebanho.
Para ajudá-lo nesse processo, conversamos com Marianna Corrêa, diretora e editora da Revista Balde Branco, que nos deu um panorama da produção de leite brasileira. Confira!
Qual o cenário tecnológico atual na produção de leite?
A tecnologia da cadeia leiteira no Brasil avançou significativamente nos últimos anos. Porém, apesar de o país ter fazendas altamente profissionalizadas, com índices de produtividade excelentes e competitivos com o resto do mundo, o que predomina é a baixa produtividade, a precariedade e a qualidade do leite abaixo dos padrões recomendados.
As normativas IN 76 e IN 77 lançadas em novembro de 2018 trouxeram, de início, preocupação aos produtores. Contudo, elas trazem sobretudo diretrizes para a implantação de Boas Práticas de Produção de Leite — que vão desde as recomendações de limpeza e higiene na ordenha das vacas, passando pelos cuidados com os equipamentos, manejo e sanidade dos animais de todas as categorias, até a sua nutrição adequada e seu bem-estar.
Para Marianna, as normativas podem ser um divisor de águas para a produção leiteira nacional que, se seguidas, estimularão o diálogo entre os elos da cadeia produtiva — produtores, transportadores do leite e indústria de laticínios. Isso resultará em uma maior profissionalização do sistema, levando à melhoria da produtividade, da qualidade da matéria-prima e da rentabilidade dos produtores.
Marianna ressalta, ainda, que não há como a produção de leite avançar em termos de produtividade, escala de produção, eficiência gerencial, qualidade do leite e rentabilidade para o produtor, se não for por intermédio da Assistência Tecnológica e Gerencial. Por si só, o produtor não conseguirá evoluir para atender às exigências que a situação do mercado impõe hoje.
O cenário é prioritariamente de falta de incentivo aos investimentos em tecnologias que melhoram o desempenho leiteiro — devido ao domínio das grandes empresas, à entrada de produtos importados e à baixa margem de lucro do produtor. Porém, nos últimos anos, houve um grande e inovador esforço de diversas instituições (como Embrapa, Emater, Senar e Sebrae) de tornar programas de assistência tecnológica e gerencial, como Balde Cheio e Educampo, acessíveis aos pequenos e médios produtores.
A especialista lembra, também, do grande trabalho de consultorias especializadas em pecuária leiteira que, muitas vezes, atuam em parceria com instituições oficiais, indústrias privadas e cooperativas para levar a tecnologia à produção de leite. Falaremos disso nos tópicos a seguir.
Em quais processos da produção a tecnologia pode ser aplicada?
Marianna nos diz que, na última década, começaram a ser adotados sistemas de ordenha de alta tecnologia (totalmente informatizados e digitais), como ordenhadeira carrossel e, mais recentemente, ordenhadeiras-robô. Isso coloca em prática a chamada Pecuária 4.0 ou Leite 4.0, em que tudo é controlado digitalmente e os dados de todo o sistema de produção são compartilhados via aplicativos.
Além disso, também há colares com sensores que captam online todas as manifestações e anormalidades de cada vaca. O registro desses dados é feito em softwares, que processam as informações e elaboram relatórios com base em tais dados, permitindo tomadas de decisão mais certeiras.
Veja a seguir alguns processos destacados pela especialista em que a tecnologia é aplicada na produção de leite.
Tecnologias e práticas racionais de manejo
São efetuados cuidados criteriosos na criação das bezerras desde os primeiros instantes do nascimento como a cura do umbigo e o fornecimento do colostro nas primeiras horas de vida (colostro armazenado, análise de sua qualidade, controle da transferência de imunização, disponibilidade de colostro em pó para suplementar).
Também há um controle do desenvolvimento das bezerras, por meio do fornecimento de uma quantidade específica de leite e de ração apropriada, até o seu desmame. Daí em diante, é realizado o manejo correto delas na recria até o momento da inseminação artificial.
É claro, também existe o bom manejo da vaca seca, com aplicação de selante nos tetos para proteção contra mastite, nutrição especial nos últimos 2 meses antes do parto e preparação para o parto.
Tecnologias de IA (Inseminação Artificial)
Essas tecnologias têm se desenvolvido expressivamente no Brasil, em fazendas profissionais com rebanho de alto padrão genético (para todas as raças leiteiras). São propriedades que iniciaram seus programas de seleção genética, com o uso de sêmen de touros ofertados pelas centrais de IA.
Hoje já utilizam técnicas de IATF (Inseminação Artificial em Tempo Fixo), TE (transferência de embrião), FIV (fertilização in vitro) e de avaliação genômica dos animais com resultados excelentes. Mas Marianna ressalta que tais fazendas são minoria, já que a maioria ainda não adota essas tecnologias.
Tecnologias de nutrição dos animais
Por suas características tropicais, o Brasil desenvolveu tecnologias de pastagens com forrageiras adaptadas às nossas condições, com uma gama enorme de espécies e cultivares adequadas regionalmente. Por isso, a grande maioria das fazendas leiteiras adota o sistema de pastejo, sendo que as mais profissionalizadas optam pelo pastejo intensivo rotacionado.
Para suprir a deficiência nutricional das forragens, utiliza-se a suplementação concentrada e o núcleo mineral na formulação das dietas.
Já nas produções intensivas, as fazendas adotam sistemas de confinamento total das vacas em lactação, como o free-stall e, mais recentemente, o compost barn e cross ventilation — que também oferecem boas condições de conforto térmico para as vacas.
Junto com essas tecnologias, há, disponíveis no mercado, inúmeros softwares de gestão para fazenda leiteira, específicos para controles de produção, de manejo, de reprodução, de nutrição, de economia e de finanças.
São ferramentas indispensáveis para qualquer fazenda que se profissionaliza, pois coletam dados dos mais diferentes aspectos da produção, oferecendo relatórios para as tomadas de decisão relacionadas à atividade.
Quais as vantagens da utilização da tecnologia na produção de leite?
Como destacamos até aqui, as tecnologias em seus mais diversos graus e acessibilidade, são indispensáveis para a melhoria do desempenho da fazenda leiteira, seja qual for o seu porte. Entretanto, Marianna lembra que cada produtor deve dar o passo de acordo com suas pernas, respeitando as condições da fazenda e a sua possibilidade financeira.
É importante destacar, também, que são necessários alguns anos para o produtor ver o rendimento sobre o investimento. Mas ele compensa, uma vez que a implementação de tecnologias aumenta o controle sobre a qualidade e a seguridade do leite, elevam a produtividade das vacas e, consequentemente, a margem bruta de lucro anual.
O resultado é uma produção cinco vezes maior do que a média nacional nas propriedades que apostam na tecnologia. É um estímulo e tanto, não é mesmo?
Quando e como investir em tecnologia na produção de leite?
Como mencionamos, este ano deve apresentar um aumento na demanda de consumo e a estabilização do mercado de leite e laticínios. Os produtores podem investir em melhorias levando em consideração o perfil da sua propriedade, pois para cada caso há a tecnologia adequada capaz de alavancar o negócio — desde que o produtor conte com uma gestão eficiente e uma equipe comprometida para fazer o melhor.
Concluindo a conversa, Marianna afirma que os caminhos do leite passam pela Assistência Tecnológica e Gerencial, pelas as tecnologias na produção do leite adequadas para cada caso, pela capacitação dos produtores e funcionários e pelo comprometimento de todos, a fim de produzir um leite de alta qualidade. Só assim o setor elevará a competitividade no mercado nacional e internacional.
Um dos fatores que influencia diretamente a produtividade do rebanho é a sua nutrição. Por isso, saiba, agora, qual o melhor tipo de pastagem para gados de corte e leiteiro!